segunda-feira, 14 de junho de 2010

Auto Engano

Neste final de semana, começamos a leitura de Auto-Engano (Eduardo Giannetti), compartilho com vocês alguns trechos, muito interessante... Boa leitura!!
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"A opinião diz quente ou frio, mas a realidade são átomos e espaço vazio”
“Não importa o que seja: pergunte a si mesmo se você conhece algo e você terá sérias razões para começar a duvidar. Antes de tudo cabe indagar, o que é conhecer? Depende é claro do nosso grau de exigência.”
“Com o saber cresce a dúvida.”
“Não é só a beleza que está nos olhos de quem a vê. Todas as sensações de dor e prazer, tudo o que pensamos, sentimos e sonhamos, todas as nossas percepções sensoriais de luz, cor, som, gostos, cheiros, calor e frio, em suma, tudo que é mental não pertence a realidade objetiva e está para ela assim como, para retomar a analogia sugerida por Descartes em Le Monde, o nome das coisas está paras as próprias coisas. O calor não está na chama, a doçura não está no doce. Se alguém roçar levemente uma pluma em sua axila ou sola do pé, você sentirá uma sensação formigante de cócegas. A realidade dirá Descartes, é a ação da pluma sobre a pele e o nervo e toda a cadeia de processos neurológicos mensuráveis que essa ação deflagra. Os efeitos subjetivos dela – nossa experiência íntima dessa fricção inocente – não passam de cócegas mentais.”
“Há um hiato instransponível entre o ver de fora da abordagem científica e o ver de dentro de quem sente, pensa e vê. Por mais que avance a análise objetiva dos processos neurológicos, por mais que se aprimorem as técnicas de observação de ressonância magnética, da eletroencefalograma e da neurovisualização em geral, o conhecimento científico gerado continuará sendo inescapavelmente externo de quem está sendo investigado.”
“ A conclusão básica do argumento sobre o hiato entre a objetividade perseguida pela ciência, de um lado e a subjetividade da experiência humana, de outro, é a tese de que não se pode esperar do progresso do conhecimento científico o que ele não pode oferecer.”
“Nada é o que parece: assim como o homem primitivo viveu num mundo de sonho em relação aos fenômenos da natureza, também nós ainda vivemos num mundo de sonho em relação a nós mesmos e pouco ou nada sabemos sobre as causas verdadeiras de nossas ações na vida prática.”
“Vivemos, de modo indeclinável, imersos em subjetividade. As perguntas fundamentais do auto-conhecimento – quem sou? O que realmente desejo? O que devo fazer da minha vida? Qual o sentido de tudo isso? – estão fora do escopo e do projeto constitutivo da ciência. Imaginar que ela será algum dia capaz de atender a nossa demanda de auto-conhecimento, valores e inteligibilidade é como esperar que um transmissor de fax interprete o sentido de um texto ou que um cego de nascence nos illumine sobre a natureza das cores.”
“ Nossos estados mentais e as configurações flutuantes de ânimo afetam pesadamente a nossa auto-imagem e as crenças que alimentamos sobre nós mesmos. A melhor proteção contra o risco onipresente de auto-engano – supondo é claro, que vale a pena proteger-se dele – é tentar elucidar e entender seus mecanismos internos e a dinâmica de sua ocorrência na formação de crenças ”
“O Pior cego é o que está convicto e seguro de que vê. Não há nada mais fácil do que apontar os erros, preconceitos e fanatismo dos outros enquanto permanecemos cegos e insensíveis aos nossos próprios.”
“Viajando num carro confortável /Por uma Estrada chuvosa do interior /Avistamos ao cair da noite um homem rústico /Solicitando-nos uma condução num gesto humilde /Tínhamos teto e tínhamos espaço e seguimos em frente /E ouvimos a mim dizer num tom de voz árido: “ Não, não podemos lever ninguém conosco” /Tínhamos avançado já boa distância, um dia de viagem talvez /Quando subitamente fiquei chocado com esta voz minha /Com este comportamento meu /E todo este mundo.” Bertold Brecht
“Se o saber científico nunca é final, o conhecimento que temos de nós mesmos parece condenado a ser eternamente inicial.”
“ A parcialidade no juízo vem de baixo e do fundo. É desagradável, mas é fato biológico: o odor de nosso excremento não nos ofende tanto quanto a dos demais. O mau cheiro é a merda dos outros.”
“ A magia do transporte situacional na arte – e no cinema e no teatro em particular – é que ela nos faz esquecer de nós mesmos e sentir sem estar sentindo. Mas o ponto arquimediano que sustenta a jornada é algo ainda mais singular. A arte tem o dom de não só nos fazer esquecer e sentir, mas de nos fazer esquecer que estamos esquecendo e de nos fazer não sentir que sentimos sem sentir.”
“Idealizar o que nos falta é uma propensão quase inerente à natureza humana. A mais doce canção de liberdade vem do cárcere. O exílio engrandece a pátria. Os pobres não riem da riqueza dos ricos. Para aqueles que suam pelo pão diário o ócio é um prêmio ardentemente desejado – até que eles o conquistam. A garota de Ipanema, com seu corpo dourado e cheia de graça é sempre a “que vem e que passa” nunca a que fica.”
“Sonhar e acreditar no sonho são o sal da vida. Não há nada de errado, em princípio, em apostar alto na vida privada ou na vida pública, corer o risco no amor, na política, nos negócios, na arte ou no que for o caso. O comportamento exploratório, ousar o novo, tentar o não tentado, pensar o impensável – é a fonte de toda mudança, de todo avanço e da ambição individual e coletiva de viver melhor . Viver na retranca, sem esperança e sem aventura, não leva ao desastre é verdade, mas não leva a nada. Pior : leva ao nada da resignação amarga que é a morte em vida – o niilismo entediado, inerte e absurdo do “ cadáver adiado que procria.”
“A tentativa das partes de fazer o que é melhor para si redunda numa situação que é pior para todas elas.”
“ Nenhuma solução é definitiva. Toda vitória é parcial, cada avanço traz novos desafios e qualquer conquista é passível de retrocesso. A prevenção do mal ajuda mas não sacia o desejo humano de encontrar o bem.”

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